ABLC, o cordel e a cultura popular
Ivaldo Gomes
Fui assistir ontem, dia 21 de agosto, a plenária da AcademiaBrasileira de Literatura de Cordel – ABLC, que se realizou no TeatroPaulo Pontes aqui em João Pessoa. Pra mim foi um momento importanteporque revi o que de melhor existe hoje na Paraíba e no Nordeste emtermos de literatura de cordel, repente e poesia popular. Dizer quepor diversos momentos fui às lágrimas, com emocionantes improvisos esaudações acadêmicas seria pouco. Confesso que não sou muito fã deacademias, mas a ABLC chamou-me muito a atenção e gostei muito do quevi e vivi ontem à tarde no Espaço Cultural. Quem não pode compareceraquele ato literário, em um sábado de chuva, perdeu a oportunidade dese emocionar com o que ali aconteceu.Essa plenária foi para empossar mais três membros efetivos em seuquadro social. O folclorista, poeta, cordelista João Dantas, orabequeiro, poeta, cordelista Beto Brito e o poeta, cordelista,pesquisador José Walter Pires. Todos três expoentes em suas áreas detrabalho. Emocionante foi ouvir a saudação de improviso do Rei doRepente Oliveira de Panelas a saudar o artista popular Beto Brito.Oliveira de Panelas - em seus cinqüenta anos de trabalho ininterrupto- é com certeza o maior repentista vivo desse país. Com todo orespeito e o reconhecimento que tenho por todos os outros. Emocionantetodas as saudações. Foi uma tertúlia literária movida a base de muitaemoção. A presença de Moraes Moreira, Neumane Pinto, Jessier Querino,Marco di Aurélio, Glorinha Gadelha, Manoel Monteiro e várias outraspersonalidades de destaque na platéia, acrescentou ao recinto umaqualidade indiscutível.Depois de empossados os novos imortais da ABLC, prestou-se uma justahomenagem a outros artistas, poetas, escritores, jornalistas, músicos,que dão relevo e destaque a cultura nordestina e em especial aparaibana. Marco di Aurélio, Moraes Moreira, Neumane Pinto, JessierQuerino, Oliveira de Panelas, Evandro da Nóbrega, Os Nonatos, ChicoCésar, Vital Farias e Bráulio Tavares, foram agraciados com a medalhacomemorativa dos vinte e dois anos de fundação da ABLC. Como você podever à tarde ontem foi de festa e que festa. Pois pela primeira vez fuia uma reunião de academia e gostei. Pois o ritual, a formalidade, detais ocasiões, termina por ser muito maçantes. Coisa pra só acadêmicoagüentar. O que não é bem o meu caso.Mas a reunião comemorativa serviu também para perceber, pelosdepoimentos e explanações do que se têm feito na ABLC, que existe umavanço na estratégia de organização da Literatura de Cordel no Brasil.E a graças à tenacidade e perseverança da ABLC, que tendo a frente opresidente Gonçalo, conseguiu de fato e de direito organizar essa áreada cultura brasileira. E que, diga-se de passagem, possui umaimportância ímpar para a formação literária de todo o nosso povo.Principalmente de nós nordestinos. Literatura de cordel e feira nonordeste brasileiro são símbolos e distinção de nossa cultura. Todanossa vida teve no advento da feira – o encontro social semanal – olocal privilegiado, onde as relações sociais se celebram e seexpandem. E na feira, a literatura de cordel, registrou para aposteridade todo um-que-fazer cultural de nosso povo.Fico feliz quando vejo tanta gente importante da nossa cultura reunidapara saudar aqueles que merecem nosso respeito, carinho e admiração.Reconhecimento! Pois é isso que esses grandes mestres da culturapopular precisam da parte da gente. Principalmente dos órgãosculturais oficiais ou não. E aqui meu apelo veemente por uma políticapublica que confira a cultura popular seu lugar de destaque. Pois aela é atribuída tudo que foi construído até os nossos dias. É dela araiz maior e mais significativa de nossa cultura. Para que chegássemosa Rui Barbosa, José de Alencar, Graciliano Ramos, Zé Lins do Rego,Augusto dos Anjos, Gonçalves Dias, Euclides da Cunha, Carlos Drummondde Andrade, Ascenço Ferreira, Raquel de Queiroz, Cecília Meireles,Nélida Piñon, Hilda Hilst, Dora Coralina, só para ficarmos em algunsimportantes para nossa formação cultural, tivemos que passar pelosgrandes artistas da cultura popular.Portanto é preciso que as Secretarias de Cultura, das váriasinstâncias governamentais desenvolvam linhas de pesquisas e detrabalho, na catalogação, no apoio a produção e na sua difusão, sobqualquer meio, dos artistas e das obras de cultura popular por essepaís afora. A Paraíba – celeiro de grandes artistas – precisatrabalhar melhor suas obrigações com toda essa área da culturapopular. Não é a toa que o maior de todos os cordelistas - consideradoo pai do cordel brasileiro - seja o paraibano de Pombal, Leandro Gomesde Melo. E eu lhes pergunto: Leandro Gomes de Melo está nas salas deaulas da Paraíba? Está e não está. Está pelo esforço de homens como opoeta e cordelista Manoel Monteiro. Mas não está por falta de apoiogovernamental para tal.A cultura popular brasileira e especialmente a nordestina, pela suagrande riqueza, precisa cada vez mais de reconhecimento, divulgação eapoio. Precisamos fazer como o Ministério da Cultura vem fazendo,abrindo e reabrindo editais onde a cultura popular é de fato umaprioridade. Mas isso precisa ser extensivo também aos governosestaduais e municipais. Pois esse é um esforço de todos. Pois um povoque não preserva sua cultura, fica sem. E sem sua cultura,principalmente de sua cultura mais legítima - a cultura popular - podeaté ser considerado um povo. Mas um povo em franca descaracterização eque poderá no futuro servir apenas como `massa de manobra' paraculturas alheias a nossa formação. Cuidar da cultura popular como faza ABLC e o MINC são garantias de que no futuro existiremos como povo,nação e raça. Com identidade, rumo na vida e na história. Fui muitofeliz ontem à tarde. Obrigado a ABLC pelo convite.
Esse texto do Ivaldo Gomes é muito tocante!
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